Hoje me peguei andando pela casa, descalça, tentando
encontrar um velho caminho que já não faço mais. O chão não tem mais o frio da
cerâmica. Não preciso mais subir escadas para chegar ao quarto. Há pouco
aprendi o lugar de todas as tomadas e interruptores. Ainda me assusto com o
ruído de motos velozes pela madrugada. E olho a porta de madeira tentando ver o
terraço que, ops, virou varanda ladrilhada.
Fico sentindo a mudança como tentativa de encaixe. Meu corpo
se estende, amplia, reverbera pelos cantos, paredes, pelo piso de madeira. Sou
do tamanho desses quartos, das janelas que ocupam uma parede inteira. Sou do
tamanho da cozinha, da área onde coloquei a máquina de lavar.
Ocupar, habitar, viver. Comecinho tive de acalmar o coração
enquanto desencaixotava os lençóis, os pratos, meus livros. Tive de me
convencer de que o caminho era certo, que tudo ia ser bom. Tive de falar isso várias
vezes pra mim. Já acendi incensos, instalei a rede, quase matei uma planta, dei
sorrisos aos vizinhos.
Já recebi amigos, pra visita, dormida, cerveja, vinho. Um de
cada vez, porque ainda tem um monte de reticências aqui. Mistura de medo de me
apegar ao espaço, como era à minha buganvília, ao jardim da frente
de casa, à goiabeira, ao pé de laranja. Às janelas da minha cozinha. Aos
pássaros pela manhã.
Faz pouco descobri um ninho na árvore que cobre praticamente
todo o meu andar. Ele fica bem pertinho da janela dos meninos. Dei um sorriso e
procurei passarinhos. Eles cantam bem cedinho, talvez pra avisar que eu não devo
sentir tanta falta de casa. Que casa é minha alma habitando o espaço em que
resolvi pousar. Com um trio amoroso e cúmplice bem junto. Eles me ancoram. E habitam esse lugar.
Carlota
17072016
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