sábado, 21 de maio de 2011

De como a vida é assim

Assim, sem mais nem menos, deu pra me dar um banzo vez em quando. Banzo que aparece quando as amigas mais próximas estão correndo tanto, como eu, que mal tem tempo de conversar e trocar papos legais, daqueles que trazem coisinhas miúdas ao seu redor. De como o ônibus estava cheio, do caos no qual se transforma a cidade em dias de chuva, que quase nos faz ser tragadas pela maré, do filho que tirou a nota máxima em um dos trabalhos que você ajudou a fazer. Também acontece dessa incomunicação se tornar incômoda, daí que o banzo vai, vem, como se ausência implicasse na diminuição do afeto que sentimos uns pelos outros.

Sei que estava tão esfuziantemente contente nesta quarta-feira, tão cheia de planos e de beleza, que não me dei conta da quinta na qual ministro 10 horas aula. E quando ela nasceu, a alegria foi minguando de mansinho. Talvez porque me lembrei mais dos problemas do que da aparente solução deles. E caiu de começar a chover e bater uma puta ventania que quase me arrasta junto. Calhou também de eu não conseguir resolver um lance e chegar atrasada no trabalho. E de não ter almoçado e de estar cansada e de não ter notícias de gente querida.

Só consegui dormir a 1h30 da manhã, para dar conta de três pareceres que eu tinha de dar como avaliadora de um congresso. Pois é, inventei de me inscrever para ser avaliadora e lá estávamos frente aos três trabalhos e ao computador. Quanto sono. Daí que acordei às 6, consegui fazer os meninos irem para a escola no horário e decidi arrumar logo as roupas, os livros e ir caminhar na praia. Porque para mim essas caminhadas intercaladas com corridas estão contribuindo para a minha sanidade. E no caminho de volta foi voltando também a alegria. Porque enquanto corria ao sabor do vento (e não contra ele), a leveza foi chegando também. E eu pude flutuar em um espaço vazio, no qual o banzo, mal entendidos, chateações e ônibus cheio no final da noite não tem vez.

Deixei que a alegria se mostrasse na areia da praia, no mar, no céu cinzento, nas pedras, agudas como alguns pensamentos. Deixei que se infiltrasse em mim o prazer de estar ali, naquele momento, ao invés de estar na cama, entre meus lençóis quentinhos. Mas quem quer um lençol maravilhoso se o sono embota os sonhos? Se a gente fica perdendo tempo parado, ao invés de fazer algo que goste muito? Se todas as chances, movimentos, idas, voltas, ficam presas num esquema que é meio medo e meio apatia mesmo?

Lembrei de quantas decisões tomei nessas caminhadas. De como construí textos inteiros em minha cabeça. Como as palavras formaram frases impregnadas de verdade, porque vinham do que eu estava deixando fluir. Não digo que não estou mais cansada, as pernas doem após 50 minutos em ritmo intenso. Mas decidi hoje ficar alegre, leve, atenta. Para aquilo que começa, o que termina, o que vai permanecer. Esse último aí, sem dúvida, sou eu. Eu permaneço. Completamente fora de prumo às vezes, totalmente inquieta, com vontade de ficar em silêncio absoluto, de não trocar palavras, gestos, arrepios. E também, insanamente, arrepiada quando quero viver. Porque pra mim é tudo intenso. Tudo parece estar a um passo de acabar, como se não houvesse mais tempo. E o tempo de ficar parada, em apatia, chorando as mágoas, deixei passar.

Carlota
20052011

(em resposta a uma amiga muito gente boa, Anna Constantino)

terça-feira, 10 de maio de 2011

Submersa

Sob a água pressinto o desejo.
E no seu beijo.
Sob a água afogo meus medos,
deixo a vida aflorar.
Submersa, a alma subverte
a ordem das coisas
e eu, novamente,
me encontro em você.