quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Fui, vi e curti

Assim como alegria, também se fabrica tristeza. Sabe não? Coloque-se aquelas músicas que relembram as dores mais profundas, angústias, as perdas. A tristeza é acachapante, de dar dó no mais duro ser humano. Há de se ficar triste às vezes.

Mas o mote não é essa senhora cinzentinha e invocada que gosta de passear em letras doídas/chorosas e sim a alegria, também ela fabricada.

E nessa história de produzir alegria, basta só um carnaval. Quer dizer, cinco dias de folia nos quais se deixa a vida de lado, abre-se uma vida nova no peito e na raça e descobre-se que, sim, é possível se divertir.

A resistência em encarar a chuva, a distância, a falta de táxis, as amigas distantes. A insistência em frevar mesmo com chuva, andar quilômetros acompanhando troças, blocos, maracatus, multidão. A conversa interminável com um mau humorado taxista que enfim rendeu-se e confessou: também comeu coxinha na Karblen e adorou. Os amigos por perto.

Cerveja gelada, cerveja quente. Vassourinhas, Agridoce, Baque Solto, Baque Virado, Otto, Alceu, Lenine, Lirinha. Lama, ladeira, palhaço e pirata. Chuva que Deus mandava. Caminhada de seis quilômetros para comprar uma colombina. Beleza, crianças, música, música, música.

E, seja menino ou menina, sempre tem quem gaste a retina procurando alguém na multidão. E na ausência da procura, se encontra. Dez, 15, 20 vezes, 20 mil pessoas diferentes. Lindas senhoras do Bloco das Flores, da Saudade, Banhistas do Pina, Flor da Lira. Posso fotografar você, minha rainha? E 300 sorrisos se abrem, em harmonia.

Alegria fabricada para saber que ela existe. E é só abrir o olho, o riso, os braços e acompanhar a beleza que ela aparece. Numa caixa de confete, purpurina, no copo descartável, no abraço, beijo, na brincadeira de vestir a fantasia e se encontrar. Eu me rendi a você. E fui carnaval.

Carlota
22022012

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Vou ser Carnaval pra você


Nas vésperas do Carnaval escolhi umas músicas lindas para escutar (entre elas Fix You, de Coldplay). Dessas que embalam sonhos, perfumam, relembram saudades. E um sorriso ao meu lado surgiu na tela do celular, enquanto a música escolhida rodava no meu quarto... Um sorriso de folião, de felicidade, de um cúmplice perfeito. Ricardo Pacheco.

E decidi que vou curtir esse Carnaval lembrando do seu  gosto por essa farra. Deixa eu lhe trazer à tona assim, com alegria, com amor, com os poucos passos de frevo em que me arrisco, com minha – lembra? – fantasia de palhacinho (diferente nos detalhes, igualzinha na essência). Saudade boa essa agora, meu amor. Saudade de sua vida bem colada na minha. E da sua mão na minha, para eu não me perder no Galo da Madrugada.

Recusei convite para curtir a paz, a natureza, em uma ilha deserta, tão bela e em boas companhias. Vou brindar você com cerveja, sentindo o coração e a pele arrepiarem com o som do Vassourinhas. Vou beber você, amar você, vestir você, dançar você nesses três dias. Sim, vai ter folia, meu bem.

Vou me aliar aos amigos carnavalescos. Vou olhar a cidade com olhos de turista, vou cansar o corpo em movimentos precisos de quem quer só dançar.

Ouvindo o frevo.
No passo, sem pressa.
Vou ser Carnaval pra você.

Eita saudade!

Carlota
160212

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Como se faz?


Uma fantasia, um Carnaval, um samba, uma ode, um romance? Como se faz o concreto quando o que a gente pensa nem existe ainda? Como se faz? Como se quer, como se pretende, como se chega nisso aí? Acabei de criar um quadro com metas/pretensões/ideias/propostas para os próximos 10 meses. Até dezembro tem coisa por lá. Tem tanta, na verdade. E eu torcendo mesmo para fazer tudo o que estou propondo, assim, suavemente, mas com um tanto de imposição – é pra ser, é pra fazer, é pra abstrair -, viu, moça?

Devo ter esquecido coisas fundamentais, tipo ser mais amena, mais alegre, mais contemplativa. Devo ter esquecido de anotar que é preciso parar também. E que é fundamental não ficar parada. O que mais curti nesses esboços de hoje foi anotar as palavras que eu quero que comandem 2012 para mim (vou aproveitar que é um ano par, que o astral começou bem): entusiasmo, compromisso, alegria, amor, persistência, família, disposição, vontade, amizade. Tinha outras lá, mas estou esquecendo. Aliás, estou esquecendo um monte de coisas desnecessárias também. Carregar uns pesos chatos. Desconfiar de que, em algum momento, eu não vou dar conta. Outras lembrei com felicidade: vai ter viagem, sim, vai ter partilha, vai ter coisas bem legais para aprender. E relembrar.

Revista Piauí de fevereiro (edição _65) me traz uma seção denominada questões afeto-desportivas. O autor, Ricardo Lísias, começou a correr após uma crise, após ter se separado, no meio de um romance acordado com uma editora, antes de uma oficina literária que iria ministrar. E foi a corrida que o impediu de sucumbir/perecer/enlouquecer (fiquei na dúvida sobre qual palavra usar). E hoje, aproveitando a momentânea licença do trabalho por conta de uma conjuntivite, fui caminhar na praia (santo remédio para quem quer pensar). Mudei o horário, que não estou agüentando o sol por enquanto. E assim, próximo às oito da noite, vou para o calçadão. E resolvo tirar o fone de ouvido e escutar, de verdade mesmo, os meus pensamentos.

E o que era caminhada foi corrida bem umas seis vezes. O fôlego ainda não me dá o direito de correr mais do que cinco minutos intercalados com a caminhada. Mas quando eu corro, é de boa, é de vontade mesmo, é pra deixar o que quer que esteja me incomodando lá pra trás. E tanta coisa está, nesse momento, nesse tempo incômodo. O maior, talvez, seja o não sentir. Sem grandes entusiasmos, sem um tanto de indignação, sem choque, sem medo, sem transgressão.

E me vi pensando que eu quero muito, muitas coisas diferentes. Aprender está em praticamente todas elas. Aprender a viver comigo, com os outros, com a vida que existe a cada dia, a cada pessoa que conheço. Aprender que eu não quero ser compreendida, explicada, esclarecida. Quero ter pontos obscuros, quero ter pontos excessivamente claros, quero tanto, tanto, que nem sei.

Como se faz uma vontade? Como se faz a realidade? Como se faz para trazer à tona o que é preciso para aquele exato momento? Não tenho nenhuma resposta. Aliás, parece que não tê-la é o requisito fundamental para viver. Que a vida então se faça. E me faça renascer.

* Sobre a corrida. Ao falar com uma amiga sobre uma ocasião em que simplesmente não pensei em nada, só fiquei sentindo o vento, o piso, o corpo em movimento, ela me explicou ser uma experiência de presença, algo que a gente sente quando faz ioga, por exemplo. Porque eu estava completamente, inteiramente ali. E, posso dizer, é uma das melhores coisas que se pode sentir. Thanks, Anamaria, pela explicação.

Carlota
150212

terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Doce

Um casal de mãos dadas. Uma menina nos braços da mãe. Uma cacheada garota brincando com o cachorrinho. O jeito que você sorri.

O casal de mãos dadas traça um percurso igual quase todos os dias, duas pessoas que devem ter mais de 50 anos de partilha. Ele, um senhor grisalho e de óculos, me deseja bom dia. E eu retribuo com meu melhor sorriso, com minha vontade, com passos mais firmes, porque vejo que os deles são vagarosos, como se já nem tivessem pressa em cumprir a rotina de caminhar. Ela parece mais velha – terá sido a vida mais dura – ou mais frágil.

Quando não os vejo, me preocupo. Porque já lhes quero bem há muito. Pois ele também é adivinho, não disse? Há cerca de um ano deparou-se comigo quase em prantos, na volta de um exame que confirmou a lesão no meu ombro. E não é que me olhou bem fundo e disse: saúde, filha, saúde. No corpo e na alma. Como não melhorar depois disso? Eles não sabem, mas lhes tenho um afeto cheio de ternura, porque me acompanham em poesia.

Ela não tinha um ano. Para onde eu ia? Não lembro. Sei que estava em um ponto de ônibus e olhei ao redor. Vi uma jovem com uma menina nos braços. Chamou minha atenção e foi aumentando a doçura da tarde observar o encantamento da filha pela mãe. E não o contrário. Tocava o rosto, os brincos, os fios soltos do cabelo materno. E sorria. E puxava e ria de riso solto e alegre. E seu olho era um descobrimento, então é essa, minha mãe, e é linda, será que sou igual? E a mãe, entregue, não a largava do colo, cheia de cuidado mesmo na ameaça de ter seu brinco arrancado pelas mãos buliçosas.

Reduzo o ritmo da caminhada na praia e penso em como queria saber desenhar. Porque vi pai e mãe passeando cúmplices com a filha e o bichinho de estimação, um poodle tão cacheado quanto a menina que não parava nunca. Avançavam, voltavam e a brincadeira dela era deleite para os dois. Como descrever a roupa que não consegui desenhar? Era início de noite, beira-mar, um tanto de frio. Camisa branca de mangas compridas, camiseta rosa por cima, sainha, meias escorregadas pelos tornozelos, tênis. Só a vi de costas, de cachos negros, de felicidade.

Sorriso. Jeitinho enviezado esse de demonstrar alegria. Mas quando ele se abre, é menino. O olho brilha, perfeito. E recebo como presente raro.

Vou adoçando a alma, a vida. Porque ela se mostra como quem é tímida e se revela aos poucos. Como quem não quer dizer e diz. Como quem precisa ser descoberta. De pura beleza, de doçura, dias inteiros. As noites também.

Carlota
070212