segunda-feira, 28 de junho de 2010

Amigas

Marina, fuçando comigo meu blog (apresentei-o a ela, explicando que a gente publica textos, fotos etc - ninoca está querendo um agora), viu minhas tags. A de amigas. E aí que ela criou uma frase para a amizade:
"Amigas são para o sempre, não para o nunca". Marina Teixeira, 10 anos neste 30 de junho de 2010.
A felicidade não tem segredos nem receitas (e não é perfeita).

Carlota
24062010
Às vezes as coisas parecem o que são.

Carlota
24062010

domingo, 27 de junho de 2010

Fábula da gentileza

Sofria. Não de indecisão, medo, insônia. Era daquela ânsia de ser gentil, até mesmo quando sibililava as palavras entre os dentes, sentindo-as uma a uma sobre a língua, como fossem se misturar e formar outras frases. Estas, as frases, não seriam suas, mas de um outro, revelado ríspido.

Educado em bons colégios, a gentileza não fora fruto desses aprendizados. Parecia intríseca a sua personalidade, que conquistava seguidores, aliados, companheiros em um ambiente para muitos doloroso. Professores, amigos, mulheres, funcionários das escolas e até mesmo o jardineiro mal humorado que praticamente afogava as plantas quando não havia ninguém olhando, até com ele haveria de ser gentil, menino de olhos claros e tez suave.

Crescendo, desenvolvera ainda mais o seu dom, tornando-se irresistível. Havia, certamente, algo escondido. Um ponto ameaçando a paz de sua sincera gentileza. É preciso dizê-lo, não era falso nem ardiloso. Por vezes o ponto escuro doía, pelo desconhecimento que tinha dele. Como se fosse um apêndice e não algo necessário, como a chuva, a morte, um beijo.

Não resistiu por muito tempo ao chamado da escuridão. Formou as frases inversas e soltou-as não por entre os dentes, mas aos gritos. Passou por louco, apaixonado, por devasso, incoerente. Causou espanto e, no fundo, alívio entre os que lhe conheciam.

A mulher que vivera observando-o de longe sorriu. Finalmente, após tantos anos, seria cúmplice. Toda aquela gentileza lhe parecera um vício. No qual ela também estivera presa por tempo demais. O olhar entre os dois era agora de reconhecimento. Dois seres irmãos nos olhos gentis e gestos impossíveis.

Carlota
25062010

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Guerreira, não. Só mulher.

Engraçado duas mulheres terem dito isso de mim. Que eu sou uma guerreira. Como se fosse uma luta a vida que eu levo. Não é. É cheia de afeto. Acho que a vontade de correr para um lado e outro, de enfrentar a rotina sem medo, de criar meus filhos de peito aberto, porque eles sabem que também sofro e tenho dúvidas, não é luta. É apenas a vida que escolhi viver.

As escolhas poderiam ter sido outras. Em algumas ocasiões foram. Por vezes me dá vontade de apenas sair por aí, sem compromisso, sem pressão, sem destino. Me dá alegria saber que em alguns momentos poderei fazer isso. Porque minha mente viaja, porque tenho esperança ou porque eu sonho.

Não há guerra. Há conflitos. Não há luta. Há meus dias. Há coisas ruins, sem dúvida. Solidão seria uma, se eu não tivesse por perto amigos tão queridos. Todos. Os abusados, os calados, os em dúvida. Os atrevidos, os inquietos. Sim. Talvez seja isso. Inquietude.

Isso eu sinto e sei que sou. Parece que algo sempre está prestes a acontecer. Parece que posso perder o bonde, o trem, o avião. Parece que, se eu deixar, o tempo vai passar por mim e eu não estarei com a janela aberta.

Guerreira pra mim é a cobradora do ônibus, a catadora de papel, a mulher de sandália rasteira que vai buscar o bolsa-família carregando os filhos, a mãe de uma criança doente, a minha empregada. Ela sim, e mesmo assim dona de um sorriso tão bonito e de um olhar generoso para com meus filhos.

Não me considerem, nem hoje nem amanhã, uma guerreira. Seria valorizar demais a rotina de uma mulher que sustenta casa, família, trabalha, e encontra tempo para amar, divertir-se, encontrar amigos onde eles estão. Não há guerra. Meus fantasmas se afastaram há muito. Continuo a viver. Estou impregnada de vontades e paisagens escondidas. E com a alma plena.


Carlota

16062010.

domingo, 13 de junho de 2010

Chuva

Chuva num dia de Santo Antônio pós dia dos namorados em que eu tive de ir a uma festa infantil (e graças a Deus uma mãe teve pena de mim e me chamou pra conversar) é dose. Só queria dormir, curtir meu edredon, comer bolo do aniversário da comadre, que a ressaca foi dureza. Desde quinta a gente comemora - cada uma aos trancos e barrancos - pois o mês de junho está sendo pauleira de tanto trabalho.

Tenho andado aérea. Mas o forró estava ótimo. Aliás, ter saído na quinta, organizado uma festa, produzido cartões para outros namorados, dançado dois dias seguidos contribuiu para manter a mente longe do que eu não quero nem pensar. Porque mulher é um bicho que gosta de complicar. E de ficar nessas de refletir.

Parei para me perguntar o porquê das coisas. Adianta não. Não tenho nenhuma resposta convincente. Só sei que está chovendo né? E quem sai nesse tempo ou se molha e pega um resfriado, ou curte o frio e esses beijos gelados que chegam com o vento.

Apois, tenho o que dizer mais não. Só que seria bom alguém conversar bem muito comigo para me distrair. Tipo assim, horas a fio. Até eu dormir.

Carlota
130610

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Uma canção de amor

Pra você, Marguinha, meu feliz aniversário

Beijo, flor


Já escrevi pequenos cantos de ano novo. Hoje vou relembrar uma canção de amor que trago no peito. Que apesar de tudo ou talvez por isso mesmo, me faça ser tão vibrante e apaixonada por viver. Mas não viver uma vida meia boca, uma coisa assim sem graça, um jeito de quem quase não anda a pé. Mas uma vida de quem se irrita e estremece e enternece com aquele olhar quase sem chão de quem tem pouco ou nada tem.

A canção de amor fala de amizade. De uma, que nasceu tão longe, mas que é minha, pela perfeição. Esteve em momentos cruciantes, imprescindível presença a dizer-me isso passa. A dizer que apesar do meu ano que era mais um, sim, sou mais velha, eu era ainda tão imatura nesse jogo que é viver a vida.

Ela a salvou quando quase morri. E a cicatriz que trago assim, na lateral do abdomen, só me lembra que estou aqui. E que durante 10 dias ela me carregou ao hospital acreditando piamente que minhas dores existiam, não eram fruto de imaginação nem de problemas, que naquele ano tão pesado não faltaram.

Nós, quase siamesas no pensamento, confundíamos o porteiro do terapeuta que tínhamos em comum. Mesmo sem nunca termos ido lá juntas, aquele cara na portaria me chamava por seu nome. Até que ouvi, ao reclamar disso: vocês parecem irmãs. Eu disse: mas ela é branca, eu sou tão negona...

Somos irmãs de alma. Daquelas que nascem procurando pela outra. Daquelas que sabem que encerram em seu peito mais do que segredos ou sofrimento. Encerram no peito alegria por terem participado de momentos importantes: o primeiro filho, a defesa do mestrado, a separação dolorida, o crescimento dos meninos.

Essa menina tão querida, que se chama Margarette, escolhi como sócia, como amiga, como pessoa que é, surpreendente. E descobri, eu que me achava tão minúscula perto do poder que ela exibia na vida, com os homens, com a família e as finanças, que podia também ensinar. Porque nesse percurso aprendi a perdoar, a amar, a vibrar, a querer e mostrar meus quereres a quem me interessar. Aprendi a ser cáustica quando necessário e até a brigar com minha amiga querida, a questionar suas frases, suas ações, seus elaborados pensamentos.

Aprendi que também posso lhe ensinar que a vida é pra gente viver. E quebrar a cara e se arrepender. E que mesmo esse arrependimento pode ser aprendizado. Porque a gente se inspira para outras coisas, se prepara para novas histórias, se mostra mais verdadeira, porque falhou ou porque aprendeu, finalmente, que não é preciso ser perfeita.

Ensinei, acredito, que não tenho culpas. Não vou me arrepender das vezes em que fui com amigos beber cerveja e deixei os filhos dormindo em casa. Não vou me arrepender de algum projeto que ficou pela metade, nem dos momentos em que tive de emendar um trabalho no outro até sentir dor e não conseguir mais fazer um cartaz que fosse.

Queria mesmo era dizer o quanto lhe sou grata. Porque se ela não abrisse meus olhos para o que eu sou, falando da vida que carrego, como Carlos, que eu amo, eu teria esquecido desse sentir. De como curto andar, dançar, parir. O quanto sou família e o quanto sou mulher. O quanto quero sempre descobrir e aprender.

Em julho tem curso de ilustração, tem espanhol. Talvez viagem no próximo ano. Encontrar outros amigos, outros mundos, outras coisas que sosseguem um coração desarvorado pela vontade que sinto de viver entre os meus. E de ser e estar e sentir-me sempre viva. Apesar dos problemas, apesar das coisas que deixei pendentes, apesar de. Porque é preciso ir. Sempre.

Hoje, 11 de junho de 2010, saúdo minha amiga que finalmente completou 40 anos. Sabendo o peso e a importância dessa idade. Sabendo do quanto somos efêmeros. E de como é preciso viver.

Hoje, 11 de junho, digo: te amo para sempre, minha querida.
Carlota
11062010.

sábado, 5 de junho de 2010

A cerimônia do adeus

Roubo de Simone de Beauvoir o título dessa crônica, ela que escreveu esse livro em uma homenagem a Sartre. Quem não leu Tete a Tete, procure-o na livraria para conhecer mais desse casal revolucionário, e dos códigos de conduta temporários de Sartre. Mas não é este o motivo da crônica. O motivo é o adeus de uma amiga (o meu, dei anos atrás); Por sinal, ela começa assim:

Hoje eu tenho de te dizer adeus. Pra quê? Já não fora dito? Já não tinha sido uma escolha? Os caminhos não tinham se separado antes de hoje à tarde?

Sim, mas eu sempre senti que podia. Voltar, me aninhar em seus braços, deixar cair os muros que levantei tão sem sentir. Ou melhor, após sentir tanta dor.

Não é hoje que você vai embora. Você vai há muito tempo. E a coragem de libertar minhas amarras você também deixou para trás. Porque houve tantos não ditos, tantas palavras que mesmo ditas não surtiram efeito, porque todas as mágoas, rancores, angústias, demoraram a passar.

Tinha de ser em pleno inferno astral? Não, não tinha. Mas tinha de ser em algum momento. Porque talvez o que ainda está perto possa ser menos doído à distância. Talvez o que fique longe alivie nossa alma e finalmente a liberte.

Mas esse adeus não pode ser sem um último beijo, sem esse abraço sufocante de não querer ir e nem deixar partir. Não pode ser sem eu me entregar mais uma vez, porque desespero com esse ir, que me diz: não vou voltar. Deixa eu te amar. Deixa. Desse jeito morno, desse jeito de quem conhece teu corpo, para quem o meu se entrega docemente, não, hoje ele é quase feroz, de tanta vontade de você de tanto tempo de tanta falta de tanta lembrança que chegou e não foi.

Há quanto tempo minha história é você? Há quanto decidi que você foi meu grande amor? Como não lhe ver nunca mais ou lhe ver em períodos determinados pelo voltar um dia ou nunca?

Ai que essa dor vai doer muito. Que esse dia não chegue hoje. Que ele sempre seja só amanhã. Que a noite se prolongue e meu choro se misture com meu gozo e queria gozar mil vezes e te beijar milhões e te encontrar sempre meu, sem reservas hoje, sem vontade de ganhar disputas verbais ou dizer que eu estava certa.

Sim, eu estava certa. E ainda estou. Certa de que você é meu grande amor. E que esse coração vai precisar de outra pausa, até chegar o tempo de renascer.

Hoje, meu amor, te digo adeus. Não volte, não me olhe, não me esqueça.


Carlota
04062010