quinta-feira, 29 de março de 2012

Domingo no Parque


Preguiça. Que ele não saiba, mas penso seriamente em desmarcar o encontro e curtir nesse domingo a minha cama. Preguiça. Levanto, tomo banho, deito de novo. Preguiça. Não há ninguém em casa, o sossego é meu. Levo o jornal para o quarto após o café e leio até a revista da TV. Não vou sair de casa nesse calor. Não quero ver ninguém.

Acordo perto das 13 horas. Quase em desespero. O encontro era às 14, no Parque da Jaqueira. Não ia chegar a tempo. Resolvo ligar. Digo que só agora me arrumo e que vou atrasar uma hora. Tudo certo.

Quando entro no parque lembro que a gente não disse aonde iria se encontrar. Não há celular para eu ligar e saber. A única referência era uma imensa toalha em tons de laranja que ele prometera levar para que a gente sentasse aproveitando a tarde. No lugar, skatistas, adeptos da corrida e caminhada, evangélicos em pregação, ciclistas, crianças, pipoqueiro e vendedor de churros. Vou tentar imaginar como você pensaria, onde você está.

Míope e sem óculos, vou olhando todas as pessoas no gramado. Até decidir usar a lógica ou intuição. Vou seguindo em frente e encontro você lendo o mesmo jornal que horas antes eu havia devorado. A toalha laranja ajudou. Você de bermuda, eu de jeans e camiseta (que fiquei em casa pensando se dava pra usar vestido e deitar na grama). Na dúvida, e na escassez de saias longas, optei pelo mais fácil.

E a gente ficou ali, conversando sobre certas angústias, certos amigos, alguns planos e outros sonhos. Os dois com lápis e cadernos que, nesse dia, não foram usados. Não havia necessidade de registros visuais daquela tarde. Guardamos todos em nossos olhos. A menina soprando para mim algumas bolhinhas de sabão. Sermos usados como esconderijo na brincadeira de um grupo de crianças. Ver um menininho dando passos ainda cambaleantes, ao lado da mãe e da irmãzinha, deliciada pela experiência de tê-lo tão perto e comandar um tanto sua caminhada.

A grama estava um pouco molhada, relembrando a chuva da manhã. A gente estava quebrando a tristeza em pedacinhos, jogando na toalha, rindo do que cada um achava muito grave. Era nosso jeito de nos divertir. E haja conversa pra dizer como conversar com outro. E haja instrução pra desbloquear meus traços. E haja observação de árvores, igreja, pessoas, chão.

Na vontade de comer churros, descobrimos o gosto em comum. Aliás, ambos adoramos doces. Quanto mais brigadeirados melhor. E de repente deu vontade de uma terceira amiga, dela estar ali. Risonha, divertida, louca de pedra (assim como nós dois), não custa ligar pra ver se chegou da viagem à Amazônia. Ela atende. Voz de sono, disse que sim, queria nos ver. Mas num ponto próximo de sua casa. Combinamos de ir até uma lanchonete na Av. Rosa e Silva para encontrá-la.

Hora de recolher a toalha, receber elogios pelas nossas bolsas (cada um gostou da usada pelo outro) e de sairmos caminhando. E como a gente gosta de andar pela cidade da gente. Devagar pela rua do Futuro, quebrando à esquerda na Malaquias, entrando na avenida. O percurso, sei lá, 15 minutos, e ela estava lá. De sorriso, de cansaço, de corpo todo esperando abraço. E a gente feliz, que a saudade foi grande.

Pra onde? Pra uma sorveteria escondidinha que ela não conhecia, a Santo Doce. Tiramisu, morango, leite ninho, cocada, nenhuma calda. Antes, um copo d’água. Cada um vai na escolha do outro e descubro o sabor de uva fresquinha no sorvete de vinho do porto. Apaziguados, com todos os detalhes da viagem contados, vamos à casa de Pedro, no Derby, caminhando juntos. Antes, passamos na de Jullie, também pertinho, para comer delícias do norte.

Na casa de Pedro direto para a cozinha. Torradas, geleia de açaí (gostei não), doce de banana, chá. Muita comida para poder juntar tudo em conversas amenas. A tarde/noite de domingo foram curtas. Para mim ficou a obrigação da despedida, pois tinha de voltar para Olinda. Ao chegar em casa, um email feliz informa do quanto nós duas deixamos o dia mais leve.

Mas acho que não foi só a gente não. Foi a cidade. O caminhar sobre ela se sentindo dono. Ciente da vontade de apenas flanar e observar prédios simpáticos, casarios, vitrais que ainda persistem naquela avenida que também abriga prédios imensos. Ainda existem recantos e uma vontade grande de senti-los em passos pequenos. Nossos.

Carlota
290312

sábado, 10 de março de 2012

Abraços


Uma noite dessas entrei no quarto do meu filho para vê-lo dormir. Abri a janela, ajeitei o lençol, acariciei seu rosto, enroscando a mão direita em seus cachos claros, com suavidade, para que não despertasse. E escuto a voz rouca desse menino/rapaz que quase ultrapassa sua cama dizendo: mãeeee. Estendeu para mim seus braços e me prendeu entre eles, num momento de encaixe entre nós dois. Beijei-o, desejei-lhe boa noite, sonhos felizes, o abençoei com meu deus. E o coração nesse momento encontrou paz.

Quando ainda éramos casados, o pai costumava sempre ir ao quarto deles, como a protegê-los no sono, com beijo de boa noite quando chegava tarde. E nesse momento meu filho mais velho falava dormindo “eu te amo, pai”. No que eu suspirava, quase em ciúme, porque nunca consegui o mesmo. Então que esta semana, quando ele me abraçou, disse a mim mesma: agora ele também me sente.

Pode ser um grito desesperado, um abraço. Pode ser nossa forma de não gritar. Usando o facebook, lembro de ter lido o post de uma ex-aluna pedindo um abraço. No que prontamente foi atendida em uma série de comentários de afeto. Ainda ontem uma amiga falou na vontade de um abraço de mãe. Amparo, aconchego ou apenas a familiaridade de quem nos recebe sem perguntas, com nossas luzes e sombras, nesse abraço materno.

O meu era de vó. Uma matrona poderosa, calada e observadora. Que me deixava deitar ao seu lado, abraçando aquele corpo gordinho e quente. Se havia tristeza, era partilhada. Se havia dor, ela ia se esvaindo. Se era felicidade, alegria, alegria nesse abraço de vó.

Esta semana foi pautada por abraços. Começando no domingo, pelo de minha filha, geralmente a primeira a se afastar do carinho. Acostumada que estou a uma certa impaciência dela em abraços demorados, estranhei quando ela me puxou novamente, ampliando  a permanência de nós duas.

O abraço é um jeito de ser sincero e falar “hoje eu pensei em você”. Também uma maneira de sentir por inteiro, de vislumbrar a alma ou confessar: preciso, preciso, preciso. Recebi e dei abraços esta semana. Alguns quase pedi. Outros, espontâneos e tranquilos, abriram caminho para um riso entregue, cumplicidade, certezas. Não abracei uma causa, não abracei meus vizinhos, anda travo com algumas pessoas. Mas ele está lá, porque hoje pensei em você. E desejei lhe abraçar.



Para amigos muito queridos, na sequência da semana: Pedro Bezerra, Jullimária Dutra, Gabriela Valadares, Ana Maria, Margarette Andrea, Pedro Medeiros, Cláudio Bezerra. E, também, aos três seres fantásticos que me recebem e acordam com beijos, abraços, felicidade: Igor, Marina, Ian.

Carlota
10032012

quinta-feira, 1 de março de 2012

Café com bobagem


Dos vícios que carrego com felicidade está o de ser uma leitora voraz e de beber café. E não me esquentem a água para um cafezinho instantâneo. Quero um sabor verdadeiro, encorpado, de um café bem forte, puro, que batizo com pouco açúcar. E, se for com leite, este deve ser fervente e em maior quantidade, quase um espresso latte. Café instantâneo me lembra leituras rasas, romance açucarado, personagens sem alma. 

Marcar um café pra falar bobagem ou refletir sobre a vida, vício maior. Hoje me rendi ao cappuccino com uma amiga. Juntas, dividimos um pão crocante com um recheio que não vou contar, mas que era acompanhado por um molhinho de mostarda com geléia delicioso. Assim como nosso encontro inesperado com um grupo do qual sinto falta. E que estava lá, no mesmo café, o Bogart. À mesa, afogattos, torradas, antepastos, aromas. E uma sintonia de quem vive e brinda também com café. Alegre a reunião, porque sem pretensão de acontecer. Relembramos pedidos em restaurantes, revi Anna Constantino, minha companheira de viagem, e outra de trabalho, Isabel. Conheci Gabriel. 

Lembrou-me o Café com Alma, de Celina e Mauro, espaço perfeito para os amantes dessa bebida e de comidinhas inesperadas, como uma tapioca de queijo gouda com geléia de uva que nos surpreendia pela inusitada e saborosa combinação. Estive neste café em sua última noite de funcionamento, a convite. Poucos sabiam de seu fechamento, eu não estava incluída. Confesso: se soubesse que não teria mais a possibilidade de apreciar a tapioca, o brownie e os frapês espetaculares, incluindo um de negresco inesquecível, teria pedido um de cada, só pra me despedir.

A amiga, os amigos, o cappuccino; o local, a noite, a comida, as bobagens. O conjunto me deixou mais leve naquela noite e hoje também. E vem daí que agradeço a Érica Nunes por ter aceito o convite feito ainda domingo para o que foi um intervalo prazeroso em uma noite de quarta-feira, mesmo sabendo que eu teria pouco mais de meia hora pra curtir o bate papo. Dos vícios que carrego com felicidade está o de estar sempre em boas companhias. Com ou sem café.

Carlota
01032012