Aquela mulher pequenininha me encheu de cócegas e ainda me ameaçou
com um mergulho corporal, provavelmente pesado, quente e alegre. Foi bom ver
seu riso e os olhos brilhantes pela recordação. “Um mergulito”. Sua descrição
encostada na parede foi tão boa que consegui visualizar a cena: mãe e filha
abraçadas na cama após um pulo surpresa dessa menina gata e amiga minha.
Durante um fim de semana estive ocupando um apartamento à
beira do rio Capibaribe. Eu, amadora desenhista e fazedora de farofas e
brigadeiros, não tinha força nos braços pra eliminar de vez as dezenas de
caixas acumuladas em um dos quartos. Me envolvi com a pintura e ilustração de
uma das pilastras, enquanto amigos lixavam móveis, furavam as paredes,
penduravam quadros, arrumavam a casa e também bebiam, escolhiam e cantavam
músicas, dançavam, viviam.
Eu me senti encaixada num espaço privilegiado. O de memórias, permanências, novidades. Cada móvel em vistas de ser restaurado; as plantas; a infinidade de copos, taças, canecas. As maravilhosas janelas e a cidade logo ali.
Me dei conta da importância de preservar. De cuidar. Guardar. Cada caixa aberta, na arrumação do segundo dia, ia revelando um pedaço de vida de Gabriela. As cartas ilustradas do amigo músico. A coleção de Agatha Christie, uma infinidade de lenços coloridos. Telas em branco ou pintadas, santos, anjos, um aparelho de sushi. Nada ali descartado ou deixado para trás. Preciso foi apenas buscar espaço, organizar, doar o que era demais, mostrar o que nem se lembrava.
Eu me senti encaixada num espaço privilegiado. O de memórias, permanências, novidades. Cada móvel em vistas de ser restaurado; as plantas; a infinidade de copos, taças, canecas. As maravilhosas janelas e a cidade logo ali.
Me dei conta da importância de preservar. De cuidar. Guardar. Cada caixa aberta, na arrumação do segundo dia, ia revelando um pedaço de vida de Gabriela. As cartas ilustradas do amigo músico. A coleção de Agatha Christie, uma infinidade de lenços coloridos. Telas em branco ou pintadas, santos, anjos, um aparelho de sushi. Nada ali descartado ou deixado para trás. Preciso foi apenas buscar espaço, organizar, doar o que era demais, mostrar o que nem se lembrava.
Então fiquei pensando naqueles que ao mudarem de casa,
espaço, deixam tudo para trás. Ao encontrar um apartamento antigo, tratam logo
de reformar o banheiro, retirar os tacos de madeira, providenciar porcelanatos.
Parecem avessos a apegos, lembranças. Gabriela trilha o caminho oposto de quem
acha tudo descartável. Restaura, manda reproduzir os azulejos antigos e, mesmo
quando incorpora móveis novos ao ambiente, revela o muito que traz dentro de
si: cada espaço recebe objetos que são apenas dele. E fazem a casa ser sua
inteiramente.
Ciúme quando a imagem da foto foi mostrada apenas a
Mariana. A minha sem vergonha cara de também quero ver o que é. A imagem fez Gabi
chorar – desculpa – e, ao mesmo tempo, deixou-a mais parecida com a fotografia. Quis
contar e nem disse para Mariana (o que aconteceu só em outro encontro). Da
lembrança da primeira farra gastronômica na sua casa, após seu retorno ao
Brasil. A primeira que eu fui.
Ao chegar à portaria do prédio em Setúbal a fortíssima sensação de estar sendo acolhida em uma onda quente de quem quer bem e gosta de casa cheia. E que a gente tinha comentado isso na mesma noite, a casa alegre. Como o seu apartamento no sábado e domingo de ocupação.
Ao chegar à portaria do prédio em Setúbal a fortíssima sensação de estar sendo acolhida em uma onda quente de quem quer bem e gosta de casa cheia. E que a gente tinha comentado isso na mesma noite, a casa alegre. Como o seu apartamento no sábado e domingo de ocupação.
E ao lavar os pratos, ouvir música e ver
suas memórias, no ocupar a cozinha e na alegria de beber descalça e livre, me achei
artista. Na permanência de uma pilastra que ainda nem terminei de pintar. Mas
que está assim, carregadinha de lembranças pra você.
Para um povo muito foda: Gabriela Valadares, Antonio de
Hollanda, Rodrigo Riszla, Mariana Freitas, Jr. Black, Raquel e Maria.
Carlota
1910-01112013