sábado, 18 de novembro de 2017

Ampulheta

Sou dessas pessoas que contam o tempo. Sei exatamente há quanto tempo a gente se conhece. Sei do dia que tua palavra veio em meio a outras mensagens e eu terminei me enredando nessa conversa e esquecendo de responder às aflições indistintas que me chegavam em paralelo à tua fala.

Sou dessas pessoas que contam. E nem precisa facebook pra lembrar que a amizade começou faz tempo, mais do que aquele que o algoritmo inventou de registrar. Sei a idade dos meus filhos, há quanto estou onde trabalho, o dia em que comecei meu primeiro, segundo e terceiro empregos.

Sei também dos aniversários queridos, dias e meses, porque os  anos acho que a gente acertou de não registrar. Conto ainda as laranjas quando as vou colocando no cesto, mesmo sabendo que comprei dez e depois mais duas, para aquele bolo de ameixa que, por incrível que pareça, também leva essa fruta e que uma amiga-vizinha me ensinou uma vida atrás.

Sim, conto esse tempo que me trouxe 48. Conto o tempo que perdi com medo de escrever a tese, conto o tempo daquele desabafo que, no final, tinha só duas linhas e meia e que era muito maior no pensamento.  Conto o tempo de quando cheguei a uma vila charmosa, faz um ano, tempo esse que fazia dois de um conhecimento, uma conversa em meio a mensagens aflitas, me trazendo uma brisa de mar bem pertinho, revolvendo cachos e sorrisos. Era um jeito de contar o passar, refugiada em edredons, séries e adolescências presentes em casa.

Eu conto o tempo o tempo todo. Sei de quando se vão, quando chegam, quando se apartam, quando brigam, quando amam. Sei de quando vivi, perdi, encontrei. Conto o tempo, compasso que não investiga minutos nem horas. Tampouco anos. O tempo é aquele que a gente precisa, fluxo que vem e vai, sem dizer muito.  

No conta-conta se muda tanto que, ao relembrar um instante distinto, a gente se vê diverso desse tempo passado. E aquilo que por ventura doía, alegrava ou inspirava conversas que chegavam em meio a mensagens aflitas e não respondidas, vira um tempo que não se precisa e não é mais.

Carlota

181117


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