Uma menina ensolarada e diva inspirou a crônica de hoje. E
trouxe de volta um baú de coisas que trago comigo. Aquelas sobre as quais falei
durante cinco anos na terapia. A necessidade de ser aceita, me sentir igual, fazer
parte do grupo ou passar despercebida. A lacuna fez parte de minha adolescência.
Porque fiquei muito magrinha, porque adorava ler, porque ficava em casa
curtindo esse mundo fantástico e terminou que de menina sapeca, comunicativa e
abraçante, fui para a sensação de desencaixe e uma timidez intensa.
Era ela que me impedia, por exemplo, de dar boa noite àquele
grupo reunido na frente da casa da vizinha (não, não era falta de educação,
Dona Creusa era primorosa neste sentido). Era ela, também, que me fazia
observar as pessoas com extrema atenção, percebendo nuances e vibrações –
legais ou não. E que me deixou desconfiada por muito tempo. Medo de gente,
sabe? Medo do que as pessoas poderiam dizer. Porque uma frase inesperada podia
gerar aquela dorzinha incômoda, um ranço na alma, um jeito cinzento de olhar o
dia. Ou tirar minha alegria.
E se a timidez foi embora, o processo de autoconhecimento
foi longo. Envolveu olhar pra esse baú
um sem número de vezes e sair descartando a opinião alheia e tão formada sobre
minha pessoa, mesmo que não me conhecessem tão bem. Envolveu ainda eu perceber
que criar rótulos para mim ou para outro tem dois gumes: se encaixa, também limita. Nem tudo
precisa ser um universo conhecido. Nem tudo tem explicação.
Vai daí vez por outra ainda estranho – e procuro controlar a
sensação ao reconhecê-la – a quantidade de gente curtindo estar ao meu lado. Pessoas
recém-chegadas me trazendo brindes inesperados. Nessa de deixar rolar afeto e
ter abraços quentes e muita conversa. Alegria com café, bolo, vinho ou cerveja.
Encaixe. Mesmo que nem sempre de ideias.
Então me espalho em amorosidades, em dengos derretidos, em
noites que se tornam manhãs. Vou entregando alguns sorrisos, conto pequenas
histórias, falo de comida e sonhos. Escuto. Entendo. Discordo. Ou dou um
mergulho no mar sem medo da noite fria. Porque os que chegam perto trazem o
coração desarmado e não tem vontade de ferir.
Sim, Alice, palavras doem muito. E como todo mundo às vezes
fala besteira, sem nem notar ou porque não consegue ter palavras boas, a gente segue
tentando aprender a espalhar amor e alegria, fazendo deles um escudo legal para
o coração. De verdade, a gente não precisa se encaixar. A gente é que molda a
vida ao nosso redor.
Com muitas lindezas, cachinhos e batom vermelho pra você
Carlota
24032015
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